Açude Cocorobó


"O açude, de certa forma a gente tem certeza que foi bem intencional mesmo, foi intencional de cobrir mesmo o cenário. Isso aí não há dúvidas. Eu acho que o governo ele pensou assim: nós temos uma chance de matar dois coelhos com uma porrada só. A gente dá água, no meio dum sertão desse, e a gente cobre."

José Américo Amorim, em entrevista concedida a Dila Reis no dia 29 de novembro de 2019 em Canudos (BA).

Açude Cocorobó, 2019
Canudos-BA
Foto: Dila Reis
Da coleção de: Dila Reis


"Olha, pelo um lado eu achei, assim, por exemplo, uns dizem assim, que foi bom Canudos hoje ter esse açude maravilhoso que nós temos. Pra muitos foi uma destruição. Achei que foi uma destruição, pra muitos. Porque não teve indenização pra esse povo, de jeito nenhum, que nem tem o meu pai, o meu sogro, e outros que moraram, eles até hoje não receberam nenhuma indenização de nada. De nada, de nada. Nem um papel, nem nada. [...] Bom, foi bom. Porque teve um período que é uma fonte de renda pra emprego dentro de Canudos. Porque se não fosse o bananal, no perímetro, não tinha emprego no açude. O açude dá pesca. Porque tirou a pesca, acabou a renda do pobre do pescador, não tem como sobreviver. "

Dona L., em entrevista concedida a Dila Reis no dia 18 de novembro de 2019 em Canudos (BA).


Açude cheio, 2002
Canudos-BA
Foto: Ir. Cirila Zambom
Da coleção de: Instituto Popular Memorial de Canudos


É, a inundação nos critica porque falam que foi pra cobrir a... o resto da guerra que ficou. Uns comentam que veio, foi pedido pra cobrir, outros acham que foi porque o DNOCS... Que precisava ser feito uma barragem, que o pessoal carente precisa, por aí tudo bem. Aí onde vem a questão, né, quando se trata do debate, né, uns dizem que foi pra cobrir o resto da guerra, outros dizem que foi porque necessitava da barragem. Eu sei que a barragem de qualquer maneira foi bom pra gente, que aqui de qualquer forma tinha que ter uma... um pessoal sofrido desse sem ter uma barragem. Aí foi feito o açude.

B., em entrevista concedida a Dila Reis no dia 02 de dezembro de 2019 em Canudos (BA).


Quando o açude sangrou, 2002
Canudos-BA
Foto: Ir. Cirila Zambom
Da coleção de: Instituto Popular Memorial de Canudos


Ói, esse açude que fizeram, minha fia, muitas pessoas são revoltadas, porque esse açude não era pra ter inundado ali o local da guerra, não. Era nada! Não era, não. Aquilo ali foi feito pra acabar a história de Canudos. [...]

Dona Duru, em entrevista concedida a Dila Reis no dia 19 de novembro de 2019 em Canudos (BA).

 
Antes da chuva, 2018
Canudos-BA
Foto: Dila Reis
Da coleção de: Dila Reis


Depois da chuva, 2019
Canudos-BA
Foto: Dila Reis
Da coleção de: Dila Reis

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Águas, 2019
Falas de Dona Duru, Dona L. e José Américo Amorim em Canudos-BA
Montagem e imagens: Dila Reis
Da coleção de: Dila Reis
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O rio Vaza-Barris, 2018
Canudos-BA
Foto: Dila Reis
Da coleção de: Dila Reis

"Aí meu pai falou assim: ‘ó, minha fia, tá mudando de Canudos Velho pra Canudos Novo’, que na época aqui era Cocorobó. Hoje aqui vai ser chamado Canudos Novo... Nova Canudos. Meu pai falava isso pra gente. Ele deixava tudo bem explicadinho pra gente. Eu falava assim: ‘porque, papai?’ E ele falava assim: ‘não, porque lá existiu a guerra, hoje tá coberta, não existe mais Canudos... Pode existir, assim, o nome Canudos Velho, e aqui Nova Canudos. Cocorobó vai morrer no papel, mesmo assim."

Dona L., em entrevista concedida a Dila Reis no dia 18 de novembro de 2019 em Canudos (BA).

Navegável, 2018
Canudos-BA
Foto: Dila Reis
Da coleção de: Dila Reis


E tem um depoimento, se não me engano é de Dona Maria Guilhermina, ela vai dar a um repórter, que ela diz, quando fala do açude, que ela vai dizer assim: ‘Porque esse açude aqui? Pra apagar o sangue de tanta gente?’ Ela diz: ‘pra cobrir o sangue de tanta gente?’ Aí ela no final diz assim: ‘vai fazer o que?’ Como se dissesse, esse ‘fazer o que’ tem uma carga tão emotiva dessa senhora, que é como se dissesse assim, ‘quem somos nós pra brigar com tudo isso? Quem somos nós? Fazer o que?’ [...] Eu não tenho dúvida, EU. Que o açude foi para apagar a memória. Tinha outros locais para ser construído, certo? E que pra acabar de corroborar o negócio, foi em plena ditadura militar que as obras chegaram a todo vapor!

João Ferreira, em entrevista concedida a Dila Reis no dia 26 de novembro de 2019 em Canudos (BA).


Espelho d'água, 2019
Canudos-BA
Foto: Tiago Castro
Da coleção de: Dila Reis


Inundações cotidianas, 2019
Canudos-BA
Foto: Dila Reis
Da coleção de: Dila Reis


Molhando os pés, 2019
Canudos-BA
Foto: Dila Reis
Da coleção de: Dila Reis


Caminho para as águas, 2019
Canudos-BA
Foto: Dila Reis
Da coleção de: Dila Reis


Lá do alto, 2019
Canudos-BA
Foto: Dila Reis
Da coleção de: Dila Reis

Comentários

  1. Parabéns pelo excelente trabalho de registar a história dando voz ao povo conselheirista e por isso mesmo dando vida à utopia sertaneja que resiste nos corações sertanejos.

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